O
conhecimento popular dita que é inerente a determinadas
espécies biológicas serem pragas, contudo, este
juízo não é válido. O conceito
de praga dita que “é qualquer organismo vivo
que cause algum prejuízo ao homem quando ambos compartilham
o mesmo ambiente”.
O controle de pragas
em um ambiente hospitalar não é uma tarefa fácil,
uma vez que se trata de um lugar que está em constante
atividade, faz uso diversos recursos que não podem
ser contaminados ou danificados no processo de eliminação
das infestações, além da presença
dos pacientes, muitas vezes extremamente fragilizados e, portanto,
mais propensos a contrair algum tipo de infecção.
É importante,
antes de se começar a discutir as infestações,
fazer uma diferenciação entre uma ocorrência
episódica e uma infestação de pragas
propriamente dita.
A primeira se dá
quando a praga encontra facilidade de acesso e entra no ambiente,
mas não encontra condições propícias
para o seu desenvolvimento e acaba morrendo ou simplesmente
abandonando o ambiente. Já numa infestação,
a praga tem acesso às áreas e ali encontram
condições adequadas para se desenvolver; essas
são as condições necessárias à
sobrevivência de todo e qualquer organismo vivo: alimento,
água e abrigo. Baseado nisso, vale também ressaltar
que qualquer relação feita entre a espécie
da praga e o ambiente específico que infesta é
falsa. É errado dizer, por exemplo, que ambientes onde
há o acúmulo de lixo e outros tipos de descartes
são infestados somente por baratas.
Qualquer praga tem possibilidade
de infestar qualquer ambiente que lhe forneça as condições
ótimas para a sua sobrevivência. É correto
dizer, portanto, que as pragas são oportunistas e sua
instalação em um ambiente, qualquer que seja,
está ligada somente à necessidade biológica
de sobrevivência e perpetuação de sua
espécie.
Definidos estes pontos
vamos, daqui em diante, tratar somente das infestações
de pragas, aquelas que necessitam ser diagnosticadas e propriamente
contidas.
As pragas que infestam
hospitais são as mesmas que ocorrem em outros edifícios.
São elas: baratas, ratos, formigas, moscas, pulgas
e afins; sendo que o principal problema da presença
desses animais em um espaço clínico reside no
fato de que são agentes disseminadores mecânicos
e/ou biológicos de doenças infectocontagiosas
causadas por protozoários, vírus, bactérias
e outros microrganismos, além de prejudicarem as condições
de esterilização de equipamentos e ambientes.
É possível,
por exemplo, como citado pelo presidente da Associação
Paulista dos Controladores de Vetores e Pragas (APRAG), Antonio
Marco França de Oliveira, que uma formiga passe por
um local onde existem materiais utilizados em curativos e,
em seguida, adentre uma sala esterilizada, podendo colocar
o procedimento em risco. Também de acordo com Oliveira,
a presença desses animais em ambiente hospitalar pode
vir a comprometer a imagem da instituição, uma
vez que é de domínio público o conceito
de que um local designado para o tratamento de enfermos deve
ser devidamente higienizado.
Ainda que o maior problema
com pragas seja a questão da contaminação
e tudo o que isto acarreta, vale destacar que há a
possibilidade de insetos se infiltrarem nas instalações
elétricas e causar danos aos equipamentos, ou até
mesmo um curto-circuito.
É necessária
atenção, uma vez que a maioria dos equipamentos
de hospitais e clínicas é alimentada por fontes
de energia elétrica.
A incidência de
pragas depende não somente da higiene e limpeza do
local, mas também da sua localização
e manutenção. Um hospital localizado, por exemplo,
às margens de um rio no qual é frequentemente
despejado esgoto, ou ainda próximo a instalações
industriais, pode ter uma higienização adequada
em suas instalações, entretanto, se seus vizinhos
não necessariamente seguirem os mesmos princípios,
acabam por ocasionar a migração de ratos, baratas
e semelhantes de uma instalação para a outra;
ou seja, os bons cuidados dentro do hospital não impedem
que as pragas de outros ambientes venham habitar o local.
Seja a infestação
de origem interna ou externa ao ambiente hospitalar, para
que o problema possa ser diagnosticado e devidamente controlado,
a sugestão de Oliveira é que todo o estabelecimento
seja monitorado periodicamente, sendo que as estratégias
de controle devem ser aplicadas de acordo com o local e com
o tipo de infestação observada. No entanto ainda
que a origem da infestação seja principalmente
externa, as medidas de higiene dentro das instalações
clínicas ajudam a minimizar o problema.
É válido
ressaltar que os trabalhadores do estabelecimento são
treinados para que possam reconhecer uma infestação
(ou o início de uma), visto que a melhor maneira de
se perceber a aglomeração de insetos e afins
ainda é de forma visual.
É importante,portanto,
que grandes hospitais possuam uma equipe diferenciada designada
para essa função. Diariamente, é importante
que haja no hospital um controlador de pragas treinado e orientado
para exercer as ações preventivas.
Atualmente, a abordagem
mais moderna para o controle de pragas em instituições
de saúde é o Controle Integrado de Pragas. Trata-se
de uma abordagem fundamentada na gestão das ocorrências
com pragas e seu uso como indicadores ambientais. Pode-se
avaliar a qualidade das instalações baseado
nas infestações presentes (ou ausentes).
A cada ocorrência
deve-se buscar entender as relações ecológicas
entre as características biológicas da praga
e os fatores ambientais oferecidos no local da infestação.
Utilizando como exemplo
a citação de Camilo Chaves, gerente de saúde
ambiental da empresa Bernardo Química, é “um
processo de tomada de decisões que envolvem encontrar
e monitorar as pragas, estabelecer limites para a ação
e seleção dos métodos de manejo.
Para isso, os hábitos e os ciclos de vida de muitas
pragas devem ser compreendidos e as medidas apropriadas para
a resolução destes problemas devem ser implementadas.
Quando uma população de pragas já está
estabelecida, o objetivo mais comum dos programas de controle
adotados é a eliminação desta população.
Porém, esta atividade só terá sucesso
se as condições iniciais que permitiram a ocorrência
da infestação sejam eliminadas ou o acesso destas
seja completamente bloqueado.”.
Pode-se entender esse
processo como o diagnóstico do problema. A partir deste
diagnóstico, as medidas preventivas e/ou corretivas
são corretamente tomadas.
Os hospitais devem estabelecer
medidas de controle em pontos críticos, mais propensos
à permissão da entrada de pragas, tais como:
- entrada e armazenamento
dos materiais – sejam eles alimentícios ou não;
- práticas de
alimentação inadequadas, com geração
de resíduos mal acondicionados e em vários locais
do hospital;
- destinação,
transporte e acondicionamento, inadequados de resíduos;
- entrada de rouparia
e outros materiais ou equipamentos;
- armazenamento e coleta
adequados de resíduos;
- manutenção
do local como vedação dos forros, telhados,
frestas, interruptores, etc.;
- janelas e portas sem
a devida proteção ou permanentemente abertas;
- presença de
goteiras, infiltrações, águas empoçadas,
além de tubulação de águas pluviais
e bueiros mal conservados;
- má conservação
ou manutenção de ralos permanentemente abertos.
O controle integrado
visa, fundamentalmente, minimizar a utilização
de agentes químicos durante as medidas corretivas.
No estágio atual esta abordagem permite, quando devidamente
aplicada à redução, uma média
de até 85% nos volumes de inseticidas aplicados e mais
de 95% no volume de raticidas, quando comparada às
técnicas tradicionais. Essa redução é
especialmente importante quando se trata de uma instituição
de saúde uma vez que, é um local onde há
alta concentração de paciente com a saúde
extremamente debilitada, além de um número bastante
considerável de idosos e crianças – que
são o principal público dessas instituições
– e é um fato cientificamente conhecido que são
mais sensíveis aos efeitos de diversos produtos químicos.
Quando se faz necessária
a utilização de produtos químicos, a
seleção daqueles que serão utilizados
deve ser muito criteriosa. É conhecido que na composição
de produtos utilizados no combate a infestações
são utilizados entre trinta e quarenta compostos ativos
e, dentre estes ingredientes, existem produtos que são
reconhecidos como altamente tóxicos, suspeitos de serem
cancerígenos, podendo afetar negativamente a reprodução
e o desenvolvimento do feto, e de interferirem no funcionamento
do sistema endócrino, que faz o controle hormonal do
corpo.
O uso de produtos químicos
é evitado, além do cuidado para com os pacientes
presentes no hospital, pelo fato de que, mesmo não
intencionalmente, os pesticidas acabam por erradicar somente
os indivíduos menos resistentes, e isso acaba por realizar
uma “seleção”.
Devemos perceber que
a seleção dos indivíduos mais fortes
e mais resistentes presentes na infestação não
serão atingidos, mas podem vir a se reinfestar, com
um aumento desordenado da população de pragas
com indivíduos resistentes aos pesticidas. Pode-se
afirmar que o início do tratamento com pesticidas,
raticidas e afins pode ser adiado e evitado para que não
se acabe criando um círculo vicioso absolutamente incorreto
e arriscado para a saúde no ambiente clínico,
pois a seleção de indivíduos mais resistentes
ao primeiro pesticida iria demandar a aplicação
de um produto mais forte para a realização do
controle e, na utilização deste, uma nova seleção
de pragas seria realizada e assim sucessivamente.
Quando se faz inevitável
a utilização de recursos químicos, o
controle de pragas e microrganismos em hospitais é
feito por empresas terceirizadas e especializadas e deve seguir
as normas estabelecidas pela Agência Nacional de Vigilância
Sanitária (ANVISA). De acordo com a ANVISA, é
de responsabilidade da empresa contratada garantir o mínimo
impacto ambiental, a preservação da boa saúde
do cliente e do encarregado da aplicação dos
produtos. Os produtos utilizados devem ser todos cadastrados
na ANVISA e sua manipulação e descarte também
é de responsabilidade da empresa contratada.
Apesar da preferência
por tratamentos não químicos, é por vezes
recomendado que haja uma desinsetização de rotina.
Quanto à periodicidade das desinsetizações
rotineiras, o ideal é que exista um histórico
de informações sobre o local e as ocorrências
de pragas.
Cabe ao profissional
técnico responsável estabelecer o número
de visitas e aplicações de acordo com o que
for considerado melhor para o estabelecimento e o cliente.
Geralmente, a periodicidade de visitas está diretamente
relacionada ao porte do estabelecimento (número de
leitos) e à localização do hospital.
As visitas podem ser semanais, quinzenais ou mensais.
Tendo em vista que determinadas
áreas são mais propensas a desenvolverem uma
infestação em relação a outras,
há uma periodicidade recomendada para melhor eficiência
na identificação e controle dos insetos.
É importante,
contudo, lembrar que estas são sugestões. São
elas:
- mensalmente, áreas
críticas como cozinhas, copas, despensas e redes de
esgoto devem ser desinsetizadas;
- a cada dois meses,
áreas de cuidados com os pacientes como enfermarias,
apartamentos, centros cirúrgicos, CTIs, UTIs, pronto-socorros
e consultórios médicos devem ser inspecionados,
sendo recomendado pela vigilância sanitária que
haja desinsetização ao menos uma vez ao ano;
- os setores administrativos
devem passar por inspeção a cada três
meses.
O controle citado acima
é, na maioria das vezes, realizado com os materiais
menos agressivos possíveis, como géis baraticidas
e formicidas, ratoeiras, entre outros. Se por alguma eventualidade
for necessário um controle químico mais eficiente
no ambiente hospitalar, certas medidas devem ser tomadas visando
garantir a segurança de todas as pessoas envolvidas
ativa ou passivamente no processo, tais como:
- ações
de controle químico devem ser de conhecimento da Diretoria
Administrativa, que, por sua vez, informará aos setores
os horários e locais que serão desinsetizados
ou desratizados;
- qualquer ação
de controle químico deve estar respaldada em normas
e rotinas técnicas, inclusive consultando a Gerência
de Controle de Zoonose em caso de dúvidas;
- é indispensável
a prescrição do produto em formulário
próprio, com o devidodetalhamento do processo de aplicação
pelo referido responsável técnico. De acordo
com uma entrevista realizada com Ronaldo Facury Brasil, diretor
técnico operacional da PPV Controle de Pragas, com
relação aos departamentos da instituição
relacionados ao controle de pragas, foi feita “uma pesquisa
com 61 hospitais na Grande São Paulo e 35% deles responderam
que o departamento de Hotelaria Hospitalar está à
frente dos trabalhos de controle de pragas. Foram também
citados setores como: segurança do trabalho, SND (Sistema
Nacional de Debêntures), higienização/governança,
manutenção e CCIH (Curso para Controle de Infecções
Hospitalares).”
Podemos então
concluir dizendo que a presença de “pragas”
em um dado ambiente é determinado, principalmente,
por um juízo de valor por parte do homem.
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